Quarentena feelings 2

Marcela Mazetto
3 min readJul 3, 2020

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Por vezes eu tenho a impressão de incômodo, de forçar situações e momentos dos quais não me pertencem, de lugares dos quais nunca deveria ter ido, de pessoas das quais nunca queria ter conhecido ou até mesmo de conversas que parecem forjadas.

Nesse vai e vem de pensamentos que a quarentena insiste em me tomar, procuro lembrar em quais as cenas da minha existência me senti eu mesma, sem medo de pensar para falar e expressar sobre quaisquer que fossem meus sentimentos mais difíceis.

Lembro de pouquíssimas faces e olhares que brilharam ao se depararem com o meu. Nomes que até hoje permanecem incrustados em mim, mesmo que o meu já não esteja mais marcado na memória deles.

Com a ótica da distância, do passar do tempo e até mesmo da possibilidade do ponteiro não continuar mais, desejo com uma fome inacabável reviver sentimentos: ter o coração cheio e o estômago revirado por uma noite recheada de cervejas, livros, poesias, Smiths e a memória de que tudo em você era música.

Deitar em seus braços, peito e pernas e perceber que a sua essência era tão parecida com a minha, carregada de canções, notas musicais e todos os sentimentos reprimidos do mundo. Dois anos se passaram desde que você me tirou do seu caminho, mas eu ainda choro no show do Zander com a nossa música, descontrolada.

“Gosto da sua risada”, em uma noite você me surpreendeu, não só em tocar toda a simplicidade que eu procuro na vida, mas também naquilo que se guardou pra sempre no lugar mais fundo da minha existência como a frase mais bonita que eu já ouvi.

Sinto saudades da casa que fiz em teus braços, das tardes e noites vidrados em filmes, de todos os cafés pelas madrugadas e cervejas pela manhã, a sua paixão pela minha curiosidade e tudo aquilo que sempre me tornou tão deslocada diante da realidade.

No meio de uma multidão de amigos, nos perdíamos por entre tragos, goles e milhares de assuntos, procurávamos um ao outro no meio do mar de pessoas e possibilidades que o universo nos oferecia para ancorarmos nosso olhar no do outro. O porto seguro no meio da tempestade.

Pensando enquanto dou leves pausas para corrigir a minha ortografia, deixo-me levar à primeira vez que deixei claro o que sentia, objetiva e me deixando a mercê da rejeição, lembro da luz vermelha do sinaleiro que me iluminava enquanto parava o carro: “Olha, eu preciso te falar uma coisa, mas você não precisa falar nada, tá? Eu te amo”. O que seria isso, se não o amor em sua mais forma mais genuína?

Cômico saber que desde o primeiro momento que te vi, a primeira vez em que coloquei meus olhos nos seus, me permiti acreditar em alma gêmea, mesmo que por uma centelha de segundos naquela rua gelada numa quinta-feira de setembro de 2017.

O conceito de amores passageiros nunca me agradou, não me agrada até hoje, mas quando lembro de nós, aceito a sua passagem, contente pela eterna recordação: sua risada que se encaixava em qualquer ambiente, sua melancolia charmosa que nos invadia pela noite, a estética beatnick da sua mente…

É…algumas pessoas realmente são a jornada e não o destino.

Por enquanto, aqui eu continuo na viagem.

Marcela contra o nada.

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Marcela Mazetto

Jornalista, feminista, emputecida e exercendo a expressão no limite (ou não).